quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

“Sei que vou ser crucificado pelo call”, diz João Bauer em exclusiva ao SuperPoker


Logo depois de perder o heads-up do LAPT São Paulo e deixar escapar a chance de se tornar o primeiro brasileiro campeão de uma etapa do tour latino-americano, João Divino Dorneles Neto, o João Bauer, teve de responder inúmeras perguntas sobre a mão final: o polêmico call com ace high que deu a vitória ao chileno Alex Manzano.
Apesar de ter apenas 24 anos, o jovem goiano respondeu a todos com a maturidade e a naturalidade de um veterano, minutos depois de ter enfrentado a grande decepção pela derrota. Essa postura chamou a atenção do SuperPoker, e o editor Guga Fakri pode conversar sobre outras coisas com a nova estrela do poker brasileiro. Confira a entrevista completa com João Bauer, o dono do melhor resultado do Brasil na história do LAPT.

João Bauer na mesa final do LAPT-SP (Carlos Monti/PokerStars)
Guga Fakri: Quando restavam apenas três jogadores, vocês fizeram um acordo para dividir a premiação. Naquele momento, você tinha quase 70% das fichas em jogo. O acordo influenciou em alguma decisão sua, ou não?
João Bauer: O acordo foi muito bom para mim. Acho que os caras nem perceberam, quando fecharam o acordo. Porque, se eu ganho, eu levaria mais que a premiação do primeiro lugar. Claro, joguei bem tranquilo o heads-up, muito em relação a isso. Mas eu estou muito satisfeito com esse segundo lugar... amargo. (risos)
GF: Para chegar em segundo, você teve que bater 534 adversários. E, para isso, com certeza você deu outros calls tão difíceis quando esse. Isso te dá uma tranquilidade? Saber que você chegou tão longe com segurança no seu jogo?
JB: Sim, meu jogo é esse. Não tem o que falar. Claro, vou ser muito crucificado por ter dado esse call. Mas é uma coisa que a gente começa a desempenhar, e passa a colocar no nosso jogo. Essa é a forma como eu jogo. E a forma como eu jogo me coloca diante de decisões difíceis o tempo inteiro. Porque eu não estou extraindo valor de par, dois pares, trinca. Estou extraindo valor de ace high, king high, queen high.
E, se você for observar a mão, o que o cara acertou foi o river. Eu dei call no flop ganhando, dei call no turn ganhando, e o cara acertou a broca no river. Claro, ele poderia não shovar o river se ele não acerta. Beleza. Ele não shovaria e eu ganharia dois milhões de fichas, e viraria o heads-up.
Claro, foi um call amargo. Vou lamentar muito ter pago no river. Mas, não tem o que reclamar. É uma coisa que venho desempenhando no meu jogo. Estou desenvolvendo isso, pra conseguir melhorar cada dia mais.
GF: Sem saber o resultado da mão, você jogaria esta mão da mesma forma?
JB: Se fosse para voltar atrás eu não daria o call, né? (gargalhadas). Eu daria o fold no river! (mais gargalhadas). Agora, pensando na mão como ela foi (rapidamente sério), eu pagaria no flop, no turn, e foldaria o river. Mas é isso. Errei. E jogador de poker é isso, tem que acertar e errar o mínimo. Eu errei cinco vezes no torneio. Este foi um erro. Um erro crucial, no heads-up. Um erro que rendeu um segundo lugar, algo totalmente frustrante (risos).
GF: Mas para errar cinco vezes, e mesmo assim chegar, é preciso ter muito jogo.
JB: Sim, mas é porque eu me propus a isso. E consegui me colocar com um stack que me permitiu errar. Por exemplo, o começo do terceiro dia foi muito complicado para mim. Saí de 1,1 milhão de fichas para 500 mil. Mas, de certa forma, é com isso que você vai aprendendo, e vai se lapidando. É isso.
GF: Você é um jogador com muitos resultados online. Mas também foi campeão goiano live (2009), foi indicado ao Prêmio FLOP como melhor jogador live, e agora é vice-campeão do maior LAPT da história. Você acha que essa transição do online para o live já terminou, ou ainda faltam detalhes para o seu jogo live ficar mais completo ainda?
JB: Acho que essa transição ainda nem começou. Não tenho uma gama de torneios live, então não dá nem pra começar. E acho que o que eu já consegui jogando live, com os poucos torneios que joguei, é algo fantástico. Já consegui fazer mesa final do 300K Zahle, já consegui um segundo lugar no torneio de 100K da Pousada do Rio Quente, fui campeão goiano em 2009. E isso com uma amostragem muito pequena. Então, acho que a transição para o live está só começando. Quando eu vier mesmo a jogar, tenho muito a crescer. Live eu jogo muito bem. Mas, preciso ainda melhorar várias coisas. Mas todo mundo precisa, de certa forma, desenvolver seu jogo para evoluir.

João comemora uma mão crucial com a torcida (Carlos Monti/PokerStars)
GF: Poker é um jogo maldito. Você acabou de conquistar um resultado incrível, mas com certeza está com um misto de sensações. Tente, por favor, descrever um pouco de como é isso. Saber que fez seu trabalho bem feito, mas mesmo assim estar com um gostinho amargo pelo resultado final.
JB:
Realmente é muito estranho. Quando eu caí em oitavo no Sunday Million, meus amigos tentaram me confortar dizendo: ‘esse é o único emprego no mundo em que você ganha R$35 mil em um dia e acha ruim’ (risos). Mas é isso. Tem de haver um ganhador. Eu queria muito que tivesse sido eu, queria muito ser o primeiro brasileiro a ganhar um LAPT. Passei muito perto disso. Mas vou buscar. No próximo, eu vou buscar.
GF: O dinheiro da premiação que acabou de ganhar vai te ajudar a ir pela primeira vez para Las Vegas, ou isso é algo que já estava no planejamento de 2011?
JB: Eu ainda não tenho uma coisa muito bem traçada. Eu já estava arrumando tudo para ir para Vegas no meio do ano. Meu sonho é conhecer Vegas e disputar a WSOP. Mas eu quero sim jogar pelo menos mais dois ou três LAPTs. E, se não atrapalhar o online, quero me programar melhor para jogar mais live. Quero jogar o Main Event da WSOP e muitos outros torneios.
Também quero ver se pinta alguma coisa de patrocínio. Porque você se bancar é muito complicado. A variância é estrondosa. Para quem não está no meio, não dá pra entender o que é isso. Quem não vive disso não sabe o que é isso.
GF: Você jogou o LAPT sem se classificar por satélite. O buy-in de R$5.000 estava dentro do orçamento ou foi um exagero?
JB: De certa forma, não está dentro do orçamento. Cinco mil reais é algo bem puxado. Não vou falar que me deixa confortável em estar jogando um torneio de R$5.000. Justamente por isso que você acaba se estressando muito. Você acaba sofrendo com a pressão. Eu, no caso, tenho muito isso porque não sou rico. Não venho de uma família rica. Então eu sei muito bem o que é dinheiro. Então, dar um buy-in como esse me assusta. Às vezes, até minha reta de domingo me assusta! (risos). Mas é normal, não pode é se preocupar.
GF: Você não ganhou o torneio, mas a sua irmã vai ganhar a Barbie dela? (No dia anterior, João disse ao SuperPoker que sua irmã mais nova havia pedido uma boneca Barbie caso ele fosse o campeão).
JB: (Risos) Ah, vai ganhar sim! Eu não cravei, mas a Barbie dela ela vai ganhar.
GF: Você está louco para chegar em casa e ver a família, certo?
JB: Com certeza. Tenho muita saudade do pessoal. Minha mãe e minha namorada torceram muito esses dias. Minha mãe ficou louca no MeBeliska (risos). Mas é muito bom ver isso, sabe? Ver o reconhecimento da família. Minha avó, cara! Minha avó estava torcendo para mim! Pensa: uma avó torcendo para um neto jogador de poker. Cara, isso é sensacional! A gente vê que a mentalidade da sociedade está mudando. E isso é realmente muito bom.
GF: Parabéns por tudo. Pelo resultado, pelo Steal Team, e pela seriedade como você encara o poker, como um trabalho, dando um passo de cada vez. Você é um exemplo para aqueles que estão começando e sonham em ser um João Bauer.
JB: Obrigado. Só tenho a agradecer. Ter esse reconhecimento é algo que eu vinha buscando.  Ser reconhecido naquilo que você faz é um sonho. Pela família, pelos amigos, pela imprensa, por tudo. Valeu!

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